As duas pombas

09-10-2011 16:02

As Duas Pombas

Duas pombas encontraram-se em cima do mesmo telhado. Vinha cada uma da sua banda e não se conheciam. 
As duas pombas não eram exactamente iguais. Uma usava penteado na cauda, em feitio de leque, ao passo que a outra não usava nenhum enfeite. 
Dizia a pomba de leque: 
- Nunca a vi por estes sítios. 
- Não sou daqui. Venho de muito longe - respondeu a outra pomba. 
- Do outro lado do rio, naturalmente? - perguntou a pomba do leque, que era curiosa. 
- De mais longe ainda, de muito mais? Do cabo do mundo! Voei tanto? 
- Eu calculo! - comentou a pomba do leque. 
Calcular, não calculava, mas não queria fazer má figura. Que sabia ela do mundo? Pouco. Nunca passara daquele largo, com uma estátua no meio. Era o que a pomba sabia e muito por alto. 
Entretida com os seus pensamentos, a pomba quase se esqueceu da companheira. Foi preciso que esta agitasse as asas, a modos que a preparar-se para a viagem. 
- Não me diga que quer ir-se embora? E para onde, se está tanto frio, lá no alto, e as nuvens tão carregadas? - perguntava a pomba citadina. 
- Tenho de ir. Talvez gostasse de ficar, mas? 
- Ora pois! Fique mesmo. O homem do cesto está aí não tarda e a minha nova amiga vai provar também - anunciava a pomba de leque. 
De cabecinha à banda, num sobressalto, a pombinha viageira perguntou: 
- Que homem do cesto? 
Tranquilizou-a a companheira: 
- Nós todas, que vivemos no largo, chamamos assim a um senhor que vem todos os dias fazer-nos uma visita e trazer-nos prendas: milho, migalhinhas de bolos, sêmeas, grãozinhos de trigo, um regalo? A minha amiga vai provar e, depois, me dirá. 
- Não posso. Tenho de ir - assegurava, muito firme, a pombinha. 
- Uma misteriosa me saiu a minha amiga. Qual é a pressa? - perguntou a pomba de leque, também de cabeça ao lado. 
Em resposta, a pomba viajante levantou uma patinha e mostrou uma anilha larga, de alumínio. Espantou-se a pomba de leque: 
- Como? Será que a minha amiga leva aí uma mensagem? Então é um pombo-correio, aliás, uma pomba-correio. Que engraçado. 
A pomba de pombal confirmou. Levava, preso à pata, um recado, uma mensagem ou uma carta de alguém para alguém. E como a pomba da cidade se mostrasse muito interessada em saber mais pormenores, ela contou-lhe os tratos todos da vida de um pombo-correio: 
- Vão buscar-nos ao pombal e metem-nos numa caixa com buraquinhos. Ali dentro, passamos dias e dias a viajar. Vamos de comboio? De avião? De automóvel? Não sabemos. Deixam-nos noutro pombal e, quando precisam de nós, enrolam uma mensagem, que metem dentro desta cápsula, presa à anilha, e largam-nos. Voamos entontecidas, procuramos a direcção de volta a casa e orientamo-nos, o que nem sempre é fácil. 
- Que trabalho fatigante! - comentou a pomba de leque. - Deixe-se dessa vida. A minha amiga dá muita importância a um papelinho, onde devem estar escritos uns gatafunhos sem interesse. Fique na nossa companhia e, daqui a dias, nem se lembra do caminho para o seu pombal. 
Asas apressadas voaram por cima das duas pombas. 
- Olhe: o homem do cesto já chegou ao largo - exclamou a pomba de leque, muito agitada. - Venha atrás de mim, que os petiscos estão à nossa espera. Venha. Não seja tola. 
- Não posso - respondeu-lhe a pomba sem leque. - Tenho de continuar a minha viagem. Não posso. 
As duas pombas abriram as asas ao mesmo tempo e voaram, mas foi cada uma para o seu lado.

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