O Alfaiate de Bagdad

08-11-2011 14:57

O Alfaiate de Bagdad

 

Lá para as terras de Bagdad, que um poderoso sultão governava, havia um alfaiate que tinha um filho tão ou mais hábil do que o pai nas artes de alfaiataria. 
A bem dizer, o rapaz não era filho de alfaiate. Encontrara-o ele, bebé ainda, dentro de um cestinho, à sua porta, abandonado sabe-se lá por quem. Mas tanto fazia. 
Recolhido e amimado, o menino crescera na casa acolhedora do velho alfaiate, sem nunca saber a sua verdadeira origem. 
Quando o pai adoptivo morreu, o jovem prosseguiu o ofício que aprendera do seu protector. Ganhou fama profissional, tanta que de longes terras vinham encomendar-lhe fatos e túnicas dos mais finos tecidos. 
Um dia, um escravo de sabre em punho veio buscá-lo para que fosse com ele a determinado sítio, para receber uma encomenda. 
- Leva a tua melhor tesoura, porque a freguesia é exigente - recomendou-lhe o escravo. 
Mas, para que o alfaiate não ficasse a saber o caminho nem localizasse o cliente, vendou-lhe os olhos com um lenço. 
Levou-o assim ao harém privado do sultão, onde, depois de tirar-lhe a venda, o apresentou às favoritas do sultão. O rapaz ficou de olhos esbugalhados, com tanta beleza à sua volta. Não sabia onde estava, mas desconfiou. 
As favoritas, de rosto velado, encomendaram-lhe um nunca mais acabar de vestidos. Estava ele a tirar as medidas, um bocado atordoado com a aventura, quando se abriu a porta. Era sultão. 
- Que está aqui a fazer este desgraçado? - perguntou o sultão, furioso. 
Não houve explicações que o satisfizessem. Nenhum homem senão ele podia frequentar aquelas salas do palácio. Quem perdesse a cabeça e arriscasse, perdia mesmo a cabeça, de verdade. 
- Mas antes de cortarem a cabeça ao intruso, chicoteiem-no com cem vergastadas - ordenou o sultão. 
Assim se dispunham a fazer quando o rapaz, tentando salvar a vida, arrancou o sabre das mãos do escravo que o trouxera e fez frente aos guardas. Tão hábil era ele a manejar a tesoura como o sabre. Um a um, derrubou os opositores. Chegando à beira do sultão, que estava desarmado, dispunha-se a trespassá-lo. Outra solução não tinha. Ou matava ou era morto. 
Nisto, uma das favoritas reparou, por um dos rasgões da camisa, estraçalhada na luta, que o rapaz tinha nas costas um singular sinal em forma de ananás. 
- É o sinal da realeza - gritou ela. - Não mates o sultão que ele é teu pai. 
Mas já o jovem alfaiate tinha acertado um profundo golpe no peito do sultão. 
Suspendeu-se à beira de vibrar o segundo. 
Foi-se ver e era verdade. Um adivinho predissera, no nascimento do príncipe, que aquele menino iria pôr em perigo a vida do pai. Por isso é que se tinham desembaraçado dele, em criança. 
O velho sultão, a esvair-se em sangue, foi socorrido pelos médicos da corte. Salvaram-no. Safou-se, mas ficou muito fracalhote, daí em diante. 
O alfaiate, agora príncipe, ocupou o seu lugar à frente do reino. Passou a governar com mais senso e justiça do que o pai. Nos intervalos da governação, talhava vestidos. No harém, as favoritas cosiam à linha. Aquilo já não parecia um palácio, mas uma fábrica de confecções. Chegaram a trabalhar para fora.

 

 

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